Que faremos com toda esta informação genética?

Por Duarte Barral


Duarte Barral

O projecto do genoma humano, que levou à sequenciação da totalidade do DNA da nossa espécie, foi, a nível científico, um dos mais ambiciosos da humanidade até hoje. No entanto, ao contrário de muitos outros, este representou apenas o início do grande projecto que é compreender o código da vida. Em linguagem mais acessível, podemos dizer que a primeira fase foi identificar e conhecer a ordem de todas as 3 mil milhões de letras do alfabeto que as nossas células usam para funcionar como um organismo, faltando-nos agora compreender o que significam. A utilidade deste projecto para a investigação biomédica é incalculável pois os cientistas dispõem agora de um mapa que, apesar de não estar ainda completamente interpretado, serve de referência fundamental.

Mas o grande público pode já também usufruir dos resultados desta ambiciosa iniciativa que envolveu milhares de cientistas por todo o mundo pois já estão a ser comercializados kits que a partir da saliva podem dizer quais as mutações genéticas presentes num indivíduo e a probabilidade de se poder vir a sofrer de determinada doença. Isto abre um verdadeiro admirável mundo novo a toda a população, que deve ser analisado. A pergunta fundamental é saber o que fazer com essa informação.


É importante a protecção dos dados genéticos pessoais

O primeiro aspecto importante é o da protecção dos dados genéticos pessoais, que já deu origem a uma lei própria nos EUA. Para não tornar esta carta muito longa irei deixar este aspecto para outra oportunidade e focar-me desta vez nos benefícios e riscos da informação disponibilizada por estes métodos.

É importante compreender que as doenças que causam mais mortes em todo o mundo, como as doenças cardiovasculares e muitos tipos de cancro, são o resultado da combinação de factores genéticos e ambientais, sendo a proporção entre estes difícil de calcular. Além disso, muitas doenças, como a diabetes, são o resultado de uma combinação de factores genéticos, não podendo ser o problema atribuído a um só gene.

Mais dúvidas do que certezas

Se aliarmos a estes factores uma probablilidade ficamos com mais dúvidas do que certezas. Por isso, as respostas obtidas através destes kits servem na maioria dos casos para pouco. Claro que há excepções como as doenças hereditárias raras que são transmitidas com uma probabilidade definida, mas mesmo estas têm uma probabilidade associada a elas e não é frequente estarem presentes numa família durante várias gerações sem serem detectadas.


Perante a ameaça muitos optariam pelo exercício físico

Face à informação de que temos uma probabilidade de 25% de sofrer de uma doença cardiovascular o que faríamos? Certas pessoas por certo pensariam que há uma probabilidade significativa de isso acontecer e que com exercício físico, cuidado na alimentação, não fumando e não bebendo talvez seja possível evitar sofrer dessa doença. Para estas pessoas a informação traria alguma vantagem na mudança de estilo de vida. Mas o risco contrário é quanto a mim mais importante pois outras pessoas pensariam que não há assim uma probabilidade tão alta de vir a sofrer a doença referida e que não seriam preciso muitos cuidados especiais.

Julgo que o segundo comportamento é bem mais grave pois uma pessoa cuidadosa com a sua saúde provavelmente adoptará comportamentos saudáveis sem ser preciso saber a que riscos está sujeita se não o fizer. Por isso, esta informação deve ser gerida por profissionais, de preferência o médico de família, que aconselham e traduzem o que se quer dizer com uma determinada probabilidade de contrarir certa doença, o que não acontece em muitos destes testes.


A ansiedade é um dos riscos desnecessário

Medo e ansiedade

Em conclusão, salvo em casos particulares e minoritários, como o de uma “simples” doença metabólica em que se se evitar um certo nutriente pode viver-se de forma perfeitamente saudável ou de uma doença hereditária nunca detectada numa família, esta informação poderá ter efeitos que se relacionam menos com a adopção de comportamentos saudáveis e mais com a reacção das pessoas ao medo e ansiedade.

E esta reacção não é de todo directamente proporcional ao risco que se corre. É bom que estes testes genéticos estejam à nossa disposição mas fazê-los em série e sem razão médica pode não trazer mais vantagens do que adoptar comportamentos saudáveis que são do conhecimento geral. Ou, ainda mais grave, levar a uma certa complacência por se saber que temos um baixo risco de contrarir uma doença e poder assim aumentar esse risco.

Tenho uma resposta lógica para essa tua pergunta, Duarte: Vamos aplicar essa informação!

A humanidade tem de aplicar o conhecimento adquirido, sem pensar em complexos, dogmas ou crenças religiosas. Para o bem da humanidade...

carlos, o problema é que a determinação de alguma caracteristica é um processo muito mais muito mais complexo que somente a informação do genoma. O genoma é todos os pares de base que nossa DNA possui.

Contudo existe muitos fatores que regulam a expressao de proteinas em nossas celulas que é basicamente o evento fundamental que ocorre para nos manter vivos.

Inclusive o dogma centra da biologia molecular esta caindo. O dogma diz DNA faz RNA que faz proteina. Já se sabe hoje que isso não é tam simples assim. Leia sobre determinismo genetico que compreenderas o que quero dizer. No google se digitar "determinismo genetico" tem um artigo em pdf é um dos primeiros a aparecer que trata disso muito claramente e em detalhes.

O determinismo genético dá-nos uma visão baseada em que os seres humanos e seus gostos são regulados por genes. Mas nem sempre é assim. Podes gostar muito de gelado de morango, mas mais tarde sofrer uma intoxicação alimentar com um que esteja em não muito boas condições, e desse modo surgir em ti aversão por gelado de morango. O determinismo é real em vários casos, mas o ambiente exterior pode influenciar o ser humano.