Descobertos glaciares nas latitudes médias de Marte

A Terra é o planeta azul por definição, mas Marte surpreende com descobertas sucessivas de massas de gelo. Desta vez, a notícia veio das latitudes médias do planeta vermelho. Foram encontrados glaciares que na sua totalidade acumulam a maior quantidade de água fora dos pólos.

Desde os anos setenta que os cientistas questionavam a constituição de formações enormes que se parecem com dobras e que existem nas latitudes médias de Marte – entre os 30 e 60 graus. Com a ajuda da sonda Mars Reconnaissance Orbiter (MRS), os investigadores descobriram que estas formações são glaciares intactos que estão escondidos por baixo de uma camada de material rochoso acumulado. A notícia é publicada amanhã na revista “Science”.

“Em conjunto, estes glaciares representam quase de certeza o maior reservatório de água em estado sólido que não está nos pólos do planeta. Só um dos locais que examinámos é três vezes maior do que Los Angeles [cidade com mais de quatro mil quilómetros quadrados], e tem cerca de 800 metros de espessura”, disse em comunicado o primeiro autor do artigo John W. Holt, da escola de Geociências de Austin, da Universidade do Texas.

A sonda estudou a região de Hellas, que fica no Sul do planeta, à latitude equivalente da maior ilha da Nova Zelândia na Terra. O aparelho mostrou que as ondas de rádio ao atravessarem o material que compõe as formações não perdem força, comportando-se como seria esperado caso atravessassem gelo. Para além disso, as ondas não são reflectidas como aconteceria se houvesse rochas na estrutura.

“Desenvolvemos o instrumento, para que pudesse funcionar neste tipo de terreno”, disse em comunicado Roberto Seu da Universidade de Sapienza em Roma, e líder do grupo científico que trabalha com a sonda. O cientista acrescenta que é necessário estudar outras formações iguais no planeta para determinar se também têm gelo.

“Existe um volume ainda maior de água em estado sólido, em depósitos no hemisfério Norte. O facto de estas formações existirem às mesmas latitudes nos dois hemisférios aponta para um mecanismo climático que explica como é que chegaram até aqui”, disse Jeffrey J. Plaut, do Laboratório a Propulsão da Jacto.

A estas latitudes, se o gelo estivesse em contacto com a atmosfera de Marte era imediatamente vaporizado. Os investigadores defendem que há vários milhões de anos o eixo do planeta estaria mais tombado, proporcionando um clima mais frio e permitindo que massas de gelo atingissem estas latitudes. Depois, através da sedimentação, uma camada de material rochoso tapou os glaciares.

Na Terra existem massas de gelo que também estão enterradas nas regiões da Antárctida e “preservam traços de organismos antigos e da história climática”, segundo James W. Head da Universidade de Brown, co-autor do artigo. Em Marte, estes glaciares podem dar informações semelhantes, mas há mais: “para além do valor científico, podem ser uma fonte de água para apoiar uma futura exploração”, sugeriu Holt.